sábado, junho 28

Nem todos são inimigos

Sergio Murilo - Presidente da Federação Nacional dos Jornalistas

Olho com um certo ar de desejo para a sorte do povo cubano. Gente que sofre agruras cotidianas, escassez de toda sorte de gêneros, mas que tem a sorte de ter um inimigo comum que aproxima os irmãos. Enquanto Cuba tiver uns certos estados unidos fustigando, podem ter certeza que aqueles nossos irmãos latinos estarão perfilados ombro a ombro, na defesa de sua sociedade, seu território, seus ideais, sua cultura, seu direito de existir como nação.

E nós o que temos? Uma tal de globalização inventada por interesses capitalistas que transforma tudo em mercadoria. Nossos inimigos são difusos e desonestos. E o pior, eles colocam todo o intelecto formado na academia a serviço dos que se locupletam da mais valia. Estranho, não?

Estranho mesmo é ver, um artigo em um jornal, produzido por um jornalista professor universitário de um curso de comunicação social oferecer uma série de argumentos desonestos pela extinção da exigência de uma formação acadêmica para o exercício profissional do jornalismo.

Se a sua argumentação não fosse desonesta, ele seria o desonesto. Como é que se diz que uma faculdade é absolutamente inócua para o exercício profissional sendo um dos professores desse curso? Na mais razoável das hipóteses está confessando a sua completa incompetência de participar na formação de profissionais jornalistas. Deveria então devolver tudo o quanto recebeu como professor universitário.

Mas a gente sabe, eu pelo menos sei, que o pseudo intelectual militante da academia está a serviço de interesses de terceiros. Ele busca tão somente fazer uma média (provavelmente com alguma compensação) com os empresários da comunicação, que querem transformar as redações em balcão de negócios. Notícias também chamadas de rec-rec (recomendadas pela direção da empresa) passariam ser a principal mola dos noticiários. A área redacional não se distinguiria dos textos publicitários. A cada “notícia” veiculada lucros seriam contabilizados pela venda do espaço. É esse o futuro que a liberdade de imprensa terá se alguma coisa não for feita para impedir este assustador andar da carruagem.

Quando lembro que tantos jornalistas e outros profissionais deram a vida para assegurar as liberdades de imprensa e democráticas do país e agora aparecem imbecis de todos os lados querendo sepultar um passado que teve as suas glórias, coro de vergonha.

Quem quer saber a origem das abobrinhas teleguiadas, basta clicar aqui.

quinta-feira, junho 26

Fora de ordem


Ontem, ao retornar do cinema, mais uma vez fui forçado a me deparar com os travestis que fazem ponto no cruzamento das avenidas Duque de Caxias e Dom Manuel. Com o passar do tempo estão ficando mais ousados. Exibiam quase todas as suas carnes, da bunda aos peitos (seios) siliconados. Tempos modernos ensinam que declarações contrárias a esses comportamentos não são nada além do que homofobia. Quem quiser achar ruim que se mude para um país de raízes mulçumanas.

E não adianta Ciro Gomes falar que Fortaleza virou um puteiro a céu aberto. A inversão de valores faz das prostitutas os astros das revistas de fofocas e dá o direito a ex-(?)garota de programa Bruna Surfistinha de criticar o deputado cearense. Largo espaço na mídia, notadamente do Sudeste-Sul do Brasil reduziu o irmão do governador ao sulfato de peido do cavalo do bandido.

Não adianta reclamar. Em nome da democracia comportamental, generalizou-se a relativização dos comportamentos. Lembro-me certa vez, em uma reunião da OAB a desembargadora presidente do Tribunal de Justiça do Estado afirmar, aos conselheiros da entidade, que não são poucas as filhas de juizes que exercitam o trotoir em busca de uma farta e fácil remuneração.

Em pouco tempo, não vai ser raro em cada família ter uma profissional do prazer em uma honrada posição social. “Eis aqui a minha prima. É destaque no Book da Unifor, faturando o suficiente para pagar um bom flat, carro importado e as melhores roupas de griffe”, vai ser lugar-comum nas altas paneladas da sociedade.

Mas o que é isso mesmo? Quais são os nossos valores? Isso é mesmo o nosso futuro? Tudo que soa contrário ao horizonte do permissivismo absoluto é logo taxado de fundamentalismo, retrógrado, ultrapassado. Sempre há um determinado grupinho de pressão forçando a barra e cobrando a plenitude da democracia, onde qualquer um tem o direito a se comportar da forma como bem quiser, em qualquer lugar, a qualquer tempo, sem prestar nenhuma satisfação a ninguém. Há alguma coisa fora da ordem universal.

PS . O filme que assisti foi "Antes que o Diabo Saiba que Você Está Morto, do Sidney Lumet. Recomendo.

quarta-feira, junho 25

Versos e reverso


Tão difícil sonhar que é escritor e conseguir os meios para levar as suas idéias à publicação. Mas graças a Deus há aqueles que acreditam em seus próprios talentos e perseveram para deleite dos que vão receber em suas mãos tão belas obras.

A minha amiga Paola conseguiu. Venceu concurso literário e com o prêmio levou ao prelo palavras que romperam sentimentos e emoções até chegar ao papel. É sua primeira obra, e espero que seja de uma série. Seu coração irrequieto tem muito a contar, filtrando com a sensibilidade dos seus sentidos. Prazer revê-la e ter a sua companhia, agora, por esses dias, dormitando em minha cabeceira.


“Descontente,

Desterritorializada

como que dentro de um shopping center.

Muleta de palavra

só tem serventia para cair

no mais profundo do magma que queima.

Ou na relva que afaga.

Se esperar bastasse...

Estou aqui desde que você fechou a janela.

Já contei quinze trens em sentido único.

O homem estranho com cara de indiano me oferece um casaco.

Ele vê que sinto frio.

Se fosse apenas isso.

Gentil,

declino da oferta.

Prefiro sentir.”

Paola Fonseca

sábado, junho 21

Simone e Rodrigo Murrer...


...com o bebê Daniel, que na altura do campeonato já deve tá um garotão. A foto já seis meses que foi tirada. Amigos paulistas com quem convivi muito menos do que o que gostaria. Depois de fixarem residência por aqui, resolveram desbravar o Brasil-central e agora aproveitam a vida tranqüilia e mansa de Anápolis, bem longe das turbulências urbanóides que todos nós estamos submetidos.

Quem sabe um dia a gente volte a se encontrar com mais calma, com tempo para contemplar um pouco mais a perfeição da natureza.

sexta-feira, junho 20

Da península

Há um tempo peguei abuso da Marília Pêra. Era demais para a minha compreensão político-social uma atriz até então participante dos movimentos engajados se alinhar ao lado de Collor de Mello em uma campanha eleitoral, dizendo cobras e lagartos do então líder sindical Lula. Não que achasse (e até hoje não acho) que ele fosse a salvação do país, ou coisa que o valha, mas fazer coro ao lado de um embusteiro era (ainda é) demais para mim. E olhe que eu considerava o trabalho profissional dela no melhor nível.

Foi preciso eu ler um artigo do seu ex-marido, Nelson Motta, na Folha de São Paulo de hoje para eu ter de volta a dimensão humana de Marília. Como encanta ver um gesto de gratidão a quem nos deu a mão em um momento difícil. Reconheço que cada vez mais raras são atitudes de reconhecimento como essa. Mais comum é o dar de ombros, quando não o troco pontuado de ingratidões. Mas fiquemos com o texto de:

NELSON MOTTA

Melodrama lusitano

LISBOA - Vim pela primeira vez a Lisboa com remotos 19 anos, em 1963, mas já a conhecia com afetuosa intimidade, graças aos romances de Eça de Queiroz: a rua das Janelas Verdes, o Bairro Alto, o Rocio, o teatro D. Maria, a rua do Ouro, o Chiado, era como rever lugares queridos, apenas imaginados.

Nas ruas, em plena ditadura salazarista, homens e mulheres de roupas feias e escuras, melancólicos e cabisbaixos, passavam como sombras. Também tive a impressão, e não só por ser muito jovem, de que só havia velhos pelas ruas. Onde estaria a juventude daquela cidade? Sentia-se medo, derrota e resignação no ar.

Em 1975, voltei a Lisboa, pouco depois da Revolução dos Cravos. Encontrei a cidade eufórica com a nova liberdade, as outrora imaculadas paredes pichadas com slogans libertários, havia alegria em todos os rostos e, nas ruas, todos pareciam jovens e cheios de esperança.

Minha filha Esperança acabara de nascer no Brasil, no último e mais terrível ano do governo Médici. Assim que cheguei, liguei para o amigo e grande ator Nicolau Brayner para irmos aos copos celebrar a chegada da miúda. Ele me disse para encontrá-lo no teatro, mas não precisava ver a peça, "é muito chata", que chegasse no final e o esperasse no camarim.

Fui recebido por uma simpática velhinha, camareira de Nicolau havia muitos anos. Chamava-se Esperança, um nome muito comum em Portugal, mas raríssimo no Brasil. Contei-lhe que minha filha era sua xará porque, em 1963, sua mãe, então com 19 anos e um filho recém-nascido, fizera uma sofrida turnê teatral pelo interior de Portugal e uma bondosa camareira a ajudara a cuidar do bebê. Chamava-se dona Esperança e inspirara Marilia a dar seu nome à filha.
Era a própria. Nos abraçamos aos prantos.

terça-feira, junho 17


Amigos que chegam, amigos que continuam depois de muitos anos de convivência, depois de a vida nos ter afastado e, em uma nova maré, nos aproxima e nos faz colegas de turma de especialização. Um domingo que poderia ter sido perdido para o lazer se transforma numa bela ocasião para apreciarmos uma paella. Estava precisando mesmo retornar ao fogão, sob pena de perder o ponto.

Queria sempre ter amigos dentro de minha casa. Clara e Bruno, sejam sempre bem vindos.

A outra foto é só para registar o show do Otto. Gente boa, apesar de ser pernambucano. Vale muito ter essa página musical embalando os meus ouvidos. Nem que seja para deixar o ambiente com zumbido nas oiças. Haja decibéis na fila do gargarejo

domingo, junho 15

Jasão e o velo de ouro

A vida ensina. Muito mais do que as frases feitas e pensamentos filosóficos que possam ecoar em nosso entorno. Pessoas supostamente cheias de experiência de vida se pegam por detalhes. Real é que ninguém é 100 por cento confiável. Se quer evitar problemas para sua vida, não deixe as pessoas se aproximarem tanto. É bem verdade que muitas valham à pena, que muitas possam ser “close friends” verdadeiros. Mas não há como saber. Olhares simpáticos, palavras carinhosas, declarações de amizade eterna podem estar revestidas de interesses outros.

A vida nos faz de objetos descartáveis. Somos consumidos pelos que nos cercam. Enquanto há uma certa simbiose, a relação flui. Mas ao mudar de andar, ao mudar status quo, tudo que parecia imutável, passa por transformações. O mais interessante é que a pessoa quando lhe descarta por razões que todos sabemos quais são, mas que tenta de todas as maneiras disfarçar, um dedo simpático, de uma mão outrora amiga, é usado para apontar todas as incorreções que por ventura nós temos. Toda a nossa conduta de vida é posta em xeque, a nossa moral é duvidosa, e as nossas práticas altamente inconvenientes, quando não nefastas e deploráveis. Nós somos postos como um entrave aos dias melhores que são buscados com todo o denodo, toda a galhardia, toda firmeza de propósito.

Enquanto o cenário nebuloso é desenhado, ainda há a perspicácia de nos usar como trampolim para se conquistar novos apreços. Afinal de contas, as palavras da salvação devem ser entendidas com toda a beatice possível e imaginável. Se há alguém que minimamente questione os arautos e as trombetas que se propõem a abrir as portas do céu, esse alguém não merece ouvidos ou credibilidade. Os passos são dados na direção daquele que oferece mais como um leilão de oportunidades. Uma licitação reversa. Quem detém mais poder, logicamente tem os domínios mais amplos. Ledo engano que pensa que está se purificando afastando de si os seus semelhantes. Vã ilusão ficar pensando que o demônio não mais habita em si, que só bons sentimentos fluem em seu coração.

Mas, como diria determinado estudioso, se queres viver muito, do bom, pouco. Amizade é bom? Então use com moderação. Amor é bom, cuidado para não se machucar amando muito. E como diria um otimista ao cair do 20º andar, ao passar do 10º andar: “até aqui tudo bem”. Se alguém estiver esperando me ver espatifado lá embaixo, aviso que sei voar. Na falta de ter o que fazer em relação aos que fogem, só aperto um certo botão que tem como a primeira inicial a letra V.

sábado, junho 14

#100


Depois de dois filmes que ficam entre o frustrante e o entediante – Homem de Ferro e o novo Indiana Jones – assisti nesta quarta-feira o Sonho de Cassandra, do Woody Allen, terceiro dele rodado em terras saxônicas. Este não é o que se pode chamar de imperdível, mas vale. O filme é contagiado por uma atmosfera tensa, bem ao estilo do autor, e prende a atenção da gente até o fim. Conta a história de dois irmãos que possuem ambições muito além de suas possibilidades circunstanciais e se embrenham em um labirinto perigoso que tem final inesperado. Na próxima semana, quero assistir Antes que o Diabo Saiba que Você Morreu. Se alguém quiser ir junto, sinta-se convidado.

Interessante como a matrix continua de vento em popa, apesar de todos os avisos, de todas as reflexões que já se fez em cima do Mito da Caverna de Platão. Tudo muda para continuar do mesmo jeito. Pequenas concessões são feitas, e sem tem um ar aparentemente respirável, no que diz respeito aos anseios de liberdade de uma sociedade.

Teoricamente se vive em uma sociedade com liberdade de expressão. Porém pouca gente sabe que o exercício dessa liberdade necessita de um bom acúmulo de capital. E quem tem o dom de explorar a mais valia vai reproduzir apenas as idéias que lhe interessam, of course my dear. Trazendo para o populacho, os movimentos sociais ficam cada vez mais esquecidos, só entrando na pauta ou na ordem do dia, quando se quer atingir alguém que se pretende inatingível.

Sem Terra, Sem Teto, professores despreparados e mal remunerados, sistemas de saúde beirando o caos, a dengue invadindo os lares, trânsito travado em toda a cidade. Educação de faz de conta, deixando toda uma juventude às cegas após anos a fio em bancos escolares. Violência combatida com hilux. Mesmo veículo que transportava dois sargentos da CPRV para extorquir motoristas incautos em plena Washington Soares.

Na disso muda. Em outubro teremos uma eleição de chapa única. Luizianne Lins é imbatível. Não pelo que ela fez (nada) ou deixou de fazer. Mas pela mediocridade reinante na cidade, nos partidos, nas pessoas, nos líderes e liderados.